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O artigo 186 e seus incisos da Constituição Federal estabelecem que a propriedade privada só tem seu direito resguardado quando, junto com os padrões de produtividade, seja cumprida a legislação ambiental e trabalhista e sua posse não gere conflitos e atenda às demandas da coletividade. A negativa raivosa desses valores traduz o perfil atrasado, arrogante e reacionário do setor ruralista e remonta a comportamentos daqueles que, ao longo dos séculos, exploraram e expropriaram direitos dos trabalhadores rurais e da natureza. O artigo é de Alberto Broch e de Willian Clementino.
Alberto Broch e Willian Clementino
Os latifundiários sempre se valeram da força bruta contra a luta pela terra e, sob o argumento da defesa da propriedade privada, praticam toda a sorte de violência, que, inclusive, resultou no assassinato de milhares de sindicalistas, religiosos e lideranças populares. Agora, eles incorporaram novas formas de reação à reforma agrária.
A criação de um “observatório de inseguranças jurídicas” é um dos instrumentos institucionais lançados para defender um suposto direito de propriedade que estaria sendo usurpado por quadrilhas de invasores de terra. Os representantes dos ruralistas também estão desenvolvendo campanhas de mídia e financiando uma rede de assistência jurídica em defesa de suas propriedades. Eles chegaram a reivindicar o emprego de tropas da Força Nacional para sustentar um plano nacional de combate às “invasões” de terras.
A senadora Kátia Abreu (DEM/TO) justifica estas ações com o argumento de que “a garantia à propriedade é direito garantido pela Constituição Federal como direito fundamental”. Essa afirmação é de um cinismo exacerbado e uma desleal tentativa de confundir a opinião pública. Os ruralistas utilizam a previsão constitucional sobre o direito de propriedade como se esse fosse absoluto e incondicional. Isso não é verdade, pois os dispositivos constitucionais exigem o cumprimento integral da função social como requisito indispensável ao direito de propriedade e como componente do princípio da igualdade e dos direitos fundamentais.
O artigo 186 e seus incisos da Constituição Federal estabelecem que a propriedade privada só tem seu direito resguardado quando, junto com os padrões de produtividade, seja cumprida a legislação ambiental e trabalhista e sua posse não gere conflitos e atenda às demandas da coletividade. O contexto legal em que se insere a propriedade não justifica um empreendimento rural que, mesmo possuindo modernos instrumentos tecnológicos ou altos índices de produtividade e lucro, negue direitos trabalhistas ou explore o trabalho escravo, comprometa os recursos hídricos e a biodiversidade, não crie emprego ou ocupação produtiva e não contribua para a soberania alimentar do povo. Uma propriedade com esse perfil não serve aos direitos da coletividade, não atende aos predicados do bem-estar social e do Estado de Direito e não assegura o direito à vida.
A segurança jurídica da propriedade está condicionada ao cumprimento da função social e não constitui crime a ocupação de propriedades inexistentes perante a lei. É por isso, inclusive, que se diz ocupação e não invasão. É a ocupação de um espaço de terra não protegido pela lei e que, por isso, deve sofrer a intervenção do Estado, para fazer que ali sejam gerados direitos, bem-estar, dignidade e produção para seus ocupantes e para a coletividade.
Assim deve agir o Estado, por exemplo, nas terras onde, segundo denúncias na imprensa, a sra. Kátia Abreu protagonizou uma invasão de área pública, expulsando dezenas de antigos posseiros para constituir uma fazenda, mantida improdutiva. Esse comportamento, como outros semelhantes, não gera direitos ao dito proprietário. É um crime contra a coletividade e, para ser restabelecido o Estado de Direito, as terras precisam ser retomadas pelo Estado e devolvidas às famílias de sem-terras, que dependem daquela terra para viver.
A função social é um princípio instituído para determinar limites ao direito de propriedade, para que o direito de uns não seja exercido em detrimento dos direitos de outros. Toda propriedade deve ter uma função social e, sobretudo, as propriedades sobre a terra, pois essas são meios originários de vida e têm a natureza como bem de produção indispensável à sobrevivência humana. Esse princípio responde aos fins gerais e sociais atribuídos aos Estados modernos, faz parte da vontade do legislador constituinte de 1988, e está consagrado por inúmeros julgados do Poder Judiciário brasileiro.
A negativa raivosa desses valores traduz o perfil atrasado, arrogante e reacionário do setor ruralista e remonta a comportamentos daqueles que, ao longo dos séculos, exploraram e expropriaram direitos dos trabalhadores rurais e da natureza. Essas ações de arbítrio e privilégios sempre se valeram das benesses do Estado de outros artifícios desprovidos de base legal e ética.
Para assegurar a segurança jurídica no campo, o Estado tem a obrigação de exercer seu papel constitucional de fiscalizar e exigir o dever positivo dos proprietários de cumprir a função social da terra. Ele também precisa intervir nas áreas onde houver descumprimento da lei, desapropriando as terras e fortalecendo a reforma agrária para gerar direitos ao povo e desenvolvimento sustentável para o País.
(*) Alberto Broch é presidente da Contag. Willian Clementino é secretário de Política Agrária da Contag
A criação de um “observatório de inseguranças jurídicas” é um dos instrumentos institucionais lançados para defender um suposto direito de propriedade que estaria sendo usurpado por quadrilhas de invasores de terra. Os representantes dos ruralistas também estão desenvolvendo campanhas de mídia e financiando uma rede de assistência jurídica em defesa de suas propriedades. Eles chegaram a reivindicar o emprego de tropas da Força Nacional para sustentar um plano nacional de combate às “invasões” de terras.
A senadora Kátia Abreu (DEM/TO) justifica estas ações com o argumento de que “a garantia à propriedade é direito garantido pela Constituição Federal como direito fundamental”. Essa afirmação é de um cinismo exacerbado e uma desleal tentativa de confundir a opinião pública. Os ruralistas utilizam a previsão constitucional sobre o direito de propriedade como se esse fosse absoluto e incondicional. Isso não é verdade, pois os dispositivos constitucionais exigem o cumprimento integral da função social como requisito indispensável ao direito de propriedade e como componente do princípio da igualdade e dos direitos fundamentais.
O artigo 186 e seus incisos da Constituição Federal estabelecem que a propriedade privada só tem seu direito resguardado quando, junto com os padrões de produtividade, seja cumprida a legislação ambiental e trabalhista e sua posse não gere conflitos e atenda às demandas da coletividade. O contexto legal em que se insere a propriedade não justifica um empreendimento rural que, mesmo possuindo modernos instrumentos tecnológicos ou altos índices de produtividade e lucro, negue direitos trabalhistas ou explore o trabalho escravo, comprometa os recursos hídricos e a biodiversidade, não crie emprego ou ocupação produtiva e não contribua para a soberania alimentar do povo. Uma propriedade com esse perfil não serve aos direitos da coletividade, não atende aos predicados do bem-estar social e do Estado de Direito e não assegura o direito à vida.
A segurança jurídica da propriedade está condicionada ao cumprimento da função social e não constitui crime a ocupação de propriedades inexistentes perante a lei. É por isso, inclusive, que se diz ocupação e não invasão. É a ocupação de um espaço de terra não protegido pela lei e que, por isso, deve sofrer a intervenção do Estado, para fazer que ali sejam gerados direitos, bem-estar, dignidade e produção para seus ocupantes e para a coletividade.
Assim deve agir o Estado, por exemplo, nas terras onde, segundo denúncias na imprensa, a sra. Kátia Abreu protagonizou uma invasão de área pública, expulsando dezenas de antigos posseiros para constituir uma fazenda, mantida improdutiva. Esse comportamento, como outros semelhantes, não gera direitos ao dito proprietário. É um crime contra a coletividade e, para ser restabelecido o Estado de Direito, as terras precisam ser retomadas pelo Estado e devolvidas às famílias de sem-terras, que dependem daquela terra para viver.
A função social é um princípio instituído para determinar limites ao direito de propriedade, para que o direito de uns não seja exercido em detrimento dos direitos de outros. Toda propriedade deve ter uma função social e, sobretudo, as propriedades sobre a terra, pois essas são meios originários de vida e têm a natureza como bem de produção indispensável à sobrevivência humana. Esse princípio responde aos fins gerais e sociais atribuídos aos Estados modernos, faz parte da vontade do legislador constituinte de 1988, e está consagrado por inúmeros julgados do Poder Judiciário brasileiro.
A negativa raivosa desses valores traduz o perfil atrasado, arrogante e reacionário do setor ruralista e remonta a comportamentos daqueles que, ao longo dos séculos, exploraram e expropriaram direitos dos trabalhadores rurais e da natureza. Essas ações de arbítrio e privilégios sempre se valeram das benesses do Estado de outros artifícios desprovidos de base legal e ética.
Para assegurar a segurança jurídica no campo, o Estado tem a obrigação de exercer seu papel constitucional de fiscalizar e exigir o dever positivo dos proprietários de cumprir a função social da terra. Ele também precisa intervir nas áreas onde houver descumprimento da lei, desapropriando as terras e fortalecendo a reforma agrária para gerar direitos ao povo e desenvolvimento sustentável para o País.
(*) Alberto Broch é presidente da Contag. Willian Clementino é secretário de Política Agrária da Contag
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